O
Chanel Nº 5 certamente é das mais icônicas fragrâncias contemporâneas, tida mesmo
como atemporal. Tem origem em um óleo essencial extraído da madeira do
pau-rosa, originário da Amazônia. Faz fama desde sua criação, atribuída a
Gabrielle Bonheur Chanel (1883-1971), em 1921, para a Coco Chanel.
A
não menos famosa Rainha de Sabá alcançou notoriedade em seu tempo – o que a imortalizou
– por sua capacidade de manusear perfumes – ‘imperatriz do aroma’, disse-o o
poeta Sosígenes Costa – e o conjunto de odores por ela destilados – da mirra ao
sândalo, da lavanda ao patchouli, do nardo ao cedro, do incenso ao bálsamo, da
murta ao ládano, da canela ao gálbano – soube-o dominar. Por tudo dela
originado envolvendo essências poetas a definem metaforicamente como lágrima
sabeia.
Mas,
no curso dos tempos, e da facilidade de acesso, a apropriação das essências não
mais somente se fundou em si mesma, mas na marca a ela atribuída. A ‘personalização
da essência’ de certa forma despreza a origem e favorece o rótulo. A mesma
essência será, assim, reconhecida por nomes diversos.
Sob
tal diapasão nomes famosos ‘vendem-se’ ao mercado de perfumarias e induzem o
consumidor à aquisição para “ser” ou “parecer” com quem lhe dá o nome.
Não
enveredemos aqui por compreender o “fetiche” da mercadoria perfume como em
torno desta filosofou Karl Marx, mas certamente seria um singular exemplo para
sua interpretação...
Mas,
por que todo esse arrazoado? Eis que descobrimos novas “essências”
perfumísticas: Michele, ex-primeira-dama tornou-se rótulo para uma essência
qualquer que será comercializada não por ela em si mas pela referência
especulativa.
Como
não bastasse anunciam uma essência com o nome do marido. Desconsiderando a
ironia de José Simão – de que a dita cuja encontraria suas raízes no “aroma
capim” – certo que a coisa já transita pela comercialização.
Lançamento
com pompa e circunstância muito brevemente. Não faltará quem esgote reservas
financeiras, saque da poupança, venha a se endividar – até mesmo reduzir o
dízimo para as igrejas, os que o pagam – para fazer parte dos enlevados que aperfeiçoarão
a sensibilidade olfativa e, para provar a utilização de tal inovação, não
causará surpresa que venham a andar se cheirando como cão pelas ruas para
demonstrar afeto, fidelidade e admiração idolátrica às fontes das “essências”.
E
ficamos a matutar, a que ponto estamos alcançados: para uma gente que ilustra
seu conhecimento universal reconhecendo Israel como país cristão (certamente
por desconhecer o assassinato de Jesus a pedido da teocracia local), que ainda
insiste em reconhecer a quadratura da Terra, que nega avanços da Ciência em
benefício da vida etc. etc. etc. trilhar por fragrâncias impostas não lhes
custará reconhecer e propagar como profecia aos quatro ventos do universo a
essência do pum como dádiva divina e a mais estonteante de tudo até hoje levada
a termo.
Em
especial alcançará eflúvios ímpares se dita ‘essência’ se originar de algum
mito ou de quem lhe esteja próximo.